segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Gildo, o suicida arrependido

IMPRÓPRIO PARA MENORES DE 18 ANOS


por Daniel Gutierrez


Gildo era um cara pacato: comia arroz com feijão e, quando faltava a farofa, o ovo frito servia; fazia o serviço e, bem ou mal, levava patada do chefe; dava flores e chocolate pra noiva, amava como os homens amam e, se a cor das unhas mudasse de "vermelho terra" pra "marrom argila" sem um "Que lindo" que viesse dele com ar de sinceridade, Gildo voltava pra casa sem um beijo de boa noite.

Naquele dia, Gildo acordou decidido: "Vidinha filhadaputa. Vou me matar."

Gildo era um cara quieto, mas tinha lá suas sacadas. "Vivi a vida tão certinho... me mato ainda hoje, mas quero ter razões pra ir pro inferno." Foi pro trabalho de carro e sentiu que nada mudava se, em vez de esperar, ele atravessasse o sinal vermelho às 5h20, desde que olhasse os dois lados. Abriu a firma, ligou todas as máquinas e, sozinho, trabalhou como se fosse qualquer dia. Quatro horas depois o chefe chegou e notou a luz de fora ainda acesa: "Gildo! A porra da luz tá acesa!" Ele: "Vai tomar no olho do seu cú, velho brocha, careca, muquirana!" Um breve silêncio e "clique", seu Enaldo apagou a "porra da luz". Saiu pra almoçar na hora do almoço em vez de terminar todo o serviço da manhã antes. Parou pra tomar café e água quantas vezes quis -- três pra cada -- e viu que isto não atrasou o trabalho.

No fim do dia, saiu da firma e, em vez de ir pra casa da namorada, passou na avenida, pegou uma puta que parecia ser novinha. Tirou do bolso a nota amassada de 50 reais, lançou nos peitos da moça, tirou o pinto da calça e disse: "Me faz gozar em menos de meia-hora. Não pago mais do que isto."

Com as pernas bambas, saiu dali e parou num posto. Comprou cerveja e bebeu. "Trem salgado!..." Lúcido, dirigiu um pouco mais. Parou o carro na frente da casa do ex-colega de escola, aquele que fazia questão de -- sempre -- azucrinar a vida do pobre Gildo. O portão era baixo, se via a janela da sala aberta. Na garrafa, vazia, mijou até mais da metade. Olhou a obra: "molotov de mijo... hehehe". Jogou pra dentro da casa e saiu assim que a ouviu espatifar-se.

Parou em frente a uma construção abandonada da cidade. tinha uns oito andares. Saiu do carro, entrou e subiu até onde dava. Lá do alto, parou na borda do chão. Antes de se jogar, pensou e percebeu que aquele dia valera a pena. "Como fui mané... a vida é boa, eu é que não sabia viver!" Desceu do prédio e andou até o carro. Na calçada, um nóia parou e pediu a carteira. "Vai se foder. Não tenho dinheiro."

Gildo tomou um tiro e morreu, arrependido por não ter se matado.


Moral da história?
"E a vida lá tem moral, afinal?"

Um comentário:

  1. Adorei o Gildo! ótima essa história. Acho que tenho mesmo uma certa admiração por esses sujeitos desesperados, soltos no mundo! Continue, conte mais histórias do Gildo antes da morte dele!
    abç da Tania.

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