quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Um xis-búrgue compreto e uma esplaite

por Daniel Gutierrez




Às vezes penso que seja chatisse de jornalista... Mas acho que você vai me entender depois que ler.


Segundona braba. Depois de uma manhã inteira (das 6h30 às 12h30) na rádio, chego em casa às 13h35, com um solzão de fritar ovo no asfalto e um rombo no estômago, onde deveria haver um almoço. Alguém aí iria querer alguma coisa além de um bom prato de arroz, feijão e ovo frito fresquinhos, feitos na hora?

Tadinha, minha mãe estava lá na área de serviço se matando com a roupa do fim de semana de uma família de 3 homens (hommers) e só ela de dona. Totalmente explicável o fato de não haver almoço pronto. Quando notou que eu tinha chegado, ela ainda disse: "Nany¹, em cima da pia tem daquele macarrão de ontem, que a dona Maria fez e o molho... Na geladeira tem o arroz que sobrou da janta. É só esquentar no microondas". O queixo caiu no chão e eu perguntei: "Macarrão com arroz, mãe?" Ela respondeu "É, filho.", com um tom de voz que por si dizia: "Realmente esperava que eu cozinhasse algo com tudo isso de roupa pra lavar?"

Eu entendi a posição da mãe. Corri pra minha carteira, peguei uma nota de 20 e saí em busca de algo pra encher o buraco, que continuava aberto e crescendo. "Acho que o carrinho de lanches do Pelé tá aberto... É lá mesmo que eu vou."

Grana no bolso, destino em mente, pé na estrada. Chegando no carrinho, vi que a mulher do Pelé atendia. Ele não estava... Eu prefiro o lanche dele, mas vá lá. Eu: "Sirley, tem muito lanche na frente?" Quando ela disse que não, logo retruquei: "Então me tira um X-Beicom²."

Sentei e esperei. Antes que o meu ficasse pronto, outros chegaram e pediram os seus. Quando o meu estava quase pronto, ela perguntou, pra minha infelicidade: "O seu é X-Beicom compreto, né?" Eu olhei... Esperei coisa de uns 5 segundos fitando o olhar de dúvida da moça, que não deve ter mais de 45 anos.

Antes que o chacal que há em mim pudesse saltar sobre ela corrigindo: "É COMPLETO, SUA ANTA! COMPLLLLLETO!!", me contive. Fiz que sim com a cabeça e resmunguei: "Aham."

Instantes depois, levantei, peguei o sanduba e ataquei. Enquanto comia, inevitavelmente prestava atenção nas pessoas que, ao meu lado, iam pegando seus pedidos. Um rapaz que também ja pegava seu lanche perguntou: "Dona, tem guaraná?" E a Sirley: "Hm... eu vou ter Coca, Fanta, suco..." E pra crucificar a odisséia em que comer um lanche se tornara, ela disse: "E tem esplaite também."

O X-Beicom esfriou subitamente na minha boca. A primeira coisa que me veio à mente foi a lata de refrigerante. Pensei: "Será que ela não sabe ler, ou o Sprite escrito na lata só é legível pra mim?" Acho que deve ter doído até no ouvido do moço, porque mal ela terminou de dizer "esplaite" ele já pedia: "Não, pode ser Spraite mesmo". Poxa, ele pronunciou corretamente!

Apressei as mastigadas, terminei de comer e paguei logo, antes que eu ouvisse outra pérola... ja tava bom por uma tarde. Enquanto voltava pra casa, pensava nesse assunto, já com vontade de escrever pra você ler, quando pensei comigo: "Gosto de beicom e ambúrguer o lanche tinha... Mas cadê o queijo? Sim, porque se é X (cheese, tradução sonora chula, do inglês pro português) Beicom, deveria ter queijo e beicom. Talvez não tivesse queijo. Poxa, mas tinha até tomate... Mas deixa pra lá.

Depois disso cheguei a pensar em fazer uma pesquisa com donos de carrinhos de lanche com a seguinte pergunta: "Por que todos os seus lanches têm X no começo?" Mas nisso eu ja tinha me acalmado, matado a fome, e toda a irritação já não fazia sentido. Mas se eu tiver que jantar, vai ser em casa. Nada de carrinhos de lanche até o fim da semana.


--

¹ É um apelido carinhoso de infância, como me chamam em casa.

² Nos meus textos, palavras importadas do inglês serão grafadas sempre como são pronunciadas, exceto quando forem nomes ou quando for conveniente escrever na grafia original.




Originalmente postado em http://papodejornalistasdaredacao.blogspot.com/ (8/fev/2010)

O Ga(...)go

por Daniel Gutierrez


Depois de uma discussão cansativa, o cara ia falar o seguinte: "Não tem ninguém na chácara, caraio..." Só que ele gaguejava um pouco.

Aí ele disse "Não tem ninguém na chácara, cara, cara, cara, cara..." Só parou quando faltou o ar e ele caiu no chão.

O problema: ele não conseguia acabar de falar "chácara", ou tava difícil conseguir falar "caraio"? Fica eternamente a dúvida. O cara morreu.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Pela intentona das Amígdalas

E o professor da oficina de produção de textos exortava à sala:
– Muito bem, meus queridos! Agora vamos botar nossas amígdalas para trabalhar!
– Mas, professor! As amígdalas não escrevem, nem declamam, nem expressam sentimento!
– Exatamente por isso! Talvez esteja na hora de elas começarem.


--

Já fui assim, fazendo até as amígdalas me inspirarem... Era uma época que eu escrevia quase sem esforço. Hah, hoje em dia, ah, como as coisas mudam...

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Canto de estrada

Prólogo:
Espere por mim, morena,
Espere que eu chego já...
O amor por você, morena
Faz a saudade me apressar.



por Daniel Gutierrez



Houve estradas em que ouvi histórias
contos do bem e do mal
que me trouxeram sonhos e encontros
canção, gangorra e final

Eiras ou beiras,
cantos sem cabeça e pé
Armados até os dedos, menina
munido de amor e de fé

Como um corcel, não sem dono
mas louco em saudade a voltar
pros braços de ti, criadouro
Teu mel, teus braços: altar

E vou feito a flecha a Teresa
De gozo, de amor e de paz
Espere por mm, minha prenda
E a lua, que brilhe sagaz.


--
Esse vai ser musicado, talvez ganhe um refrão. Quando estiver pronto, gravo um vídeo e posto aqui. O prólogo, como não dispensasse comentários, é da música "Espere por mim, morena", de Gonzaguinha.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Botafogo (Queima)

por Daniel Gutierrez


A saia mais curta
o café mais preto
a barra da burca
e a barca ao relento

O talo do cravo
a pá de cimento
a moça mais bela
e o bairro mais gueto

O livro mais grosso
o jarro mais cheio
a barba do moço
o risco no meio

O quase no nada
O fardo alheio
a tal rebimboca
do engenho ao recreio

Morcego ou pardal
canino ou felino
a arara no pau
menina ou menino?

A mãe do bebê
o arco da velha
sem gana ou porquê
Veneza ou Marselha

Central ou geral
real ou banal
Carvalho ou Magal
good man or outlaw

De pano ou metal
garboso ou boçal
De pedra ou marfim
carvão, o nanquim
(Se é bom ou ruim)